agosto 31, 2005

Chora...
Solta tudo o que tens dentro de ti, deixa que as lágrimas de libertem dessa tristeza constante que não sabes ou queres explicar.
Desata o nó que trazes no peito, grita, bate, ofende...e chora.
Deixa que as lágrimas se transformem no ribeiro que vai transportar todas as tuas angústias, os teus medos, as tuas revoltas.
Não tenhas medo, que a Vida segue sempre, serena. Nós é que lhes acrescentamos curvas tortuosas que, por vezes, nos fazem derrapar.
Levanta a cabeça, respira fundo, aceita o que tens de bom e deita fora o que te faz chorar. Porque nada, nem ninguém, merece que se chore assim.

Primeiro penetrei a areia, devagar. Deixei que aqueles milhões de grãos quentes me fizessem cócegas enquanto ouvia o mar que me conhece tão bem.
Depois atravessei o areal. Vi pedras coloridas, cemitérios de algas e rochas a cheirar a iodo.
Andei quilómetros a pé à beira mar, deixando que o Oceano chamasse por mim em forma de música e espuma branca. Fugi-lhe, dançando com ele num vai-vém de ondas que me procuravam a cada instante, fazendo-as escorregar por entre os dedos dos pés.
Deitei-me na areia deserta e fi-lo esperar por mim.
Ouvia-o ao longe, num chamar de desejo insistente...
Despi-me e entrei nele, devagar. Arrepiei-me com o seu afago, desejei penetrar mais e mais.
E, devagar, fomos um só no momento em que mergulhei nele e me deixei envolver nas suas vagas salgadas, para sempre, numa cumplicidade que só existe quando sonhamos.

agosto 30, 2005


As minhas férias acabam amanhã.
Vou aproveitar o dia para ir à praia, ali no Baleal.
Gosto de me sentir rodeada por mar, de ver as Berlengas mesmo à minha frente, sentir Peniche ali ao lado.
Deitar-me na areia e deixar que o sol me acaricie a pele enquanto tento não pensar em nada.
Sentir o frio da água do mar, arrepiar-me quando entro nele, dançar com ele nas ondas sempre tão brancas de espuma.
Fechar os olhos e fundir-me todos aqueles elementos. Quero ser brisa, areia, água, sal e sol. Um de cada vez e todos ao mesmo tempo.
E, finalmente, sentir Paz.

Poema das coisas belas

As coisas belas,
as que deixam cicatrizes na memória dos homens,
por que motivo serão belas?
E belas, para quê?

Põe-se o sol porque o seu movimento é relativo.
Derrama cores porque os meus olhos vêem.
Mas por que será belo o pôr do Sol?
E belo, para quê?

Se acaso as coisas não são coisas em si mesmas,
mas só são coisas quando coisas percebidas,
por que direi das coisas que são belas?
E belas, para quê?

Se acaso as coisas forem coisas em si mesmas
sem precisarem de ser coisas percebidas,
para quem serão belas essas coisas?
E belas, para quê?

António Gedeão, Poemas póstumos (1987)

agosto 29, 2005


Entro numa casa que não é minha, mas já foi.
Toco com os dedos nos objectos que me são tão familiares e, simultaneamente, tão estranhos como se os visse pela primeira vez . O cheiro, esse, é o mesmo e invade-me as narinas violentamente, enchendo-me o peito de saudades desse passado tão recente em que percorria todas estas divisões com o à vontade de quem por lá passa todos os dias.

Fecho os olhos.
Deixo-me cair no chão e sinto o conforto do soalho de madeira quente, sólido, protector. Adivinho os objectos que estão ao meu redor sem precisar de os tocar.
Mais do que objectos e paredes, que jamais serão meus, são as memórias que me tocam. E doem.

A porta abre-se e sinto os teus olhos poisados em mim. Oiço os teus pés a pisar o chão mesmo a meu lado;passas como se eu não estivesse ali.
Talvez não esteja.
E talvez nunca tenha estado...

Sábado à noite, quase duas horas sentada numa esplanada das Docas.
Balanço de tipos giros que vi entretanto: dois. DOIS! ( E só conta um, porque o mais giro estava sentado ao meu lado)
Das duas, três: ou eu sou muito selectiva, ou os gajos giros foram todos de férias, ou vão para outro sítio que eu não conheço...
Help me, girls!!

agosto 28, 2005


Entrou na gare sem olhar para trás, a mochila numa mão e o bilhete do comboio na outra. Percorreu de forma serena os longos metros que a levavam ao seu lugar, aparentemente indiferente à multidão barulhenta que a rodeava, entre beijos de adeus e saudades antecipadas; o cenário era-lhe familiar e sentia-se contente por estar sozinha; detestava despedidas públicas, emoções expostas a estranhos.

Sentou-se finalmente no seu lugar e olhou para o relógio: faltavam ainda dez minutos, afinal poderia ter comprado uma revista. Apreciou o silêncio do comboio praticamente deserto ainda, sabendo que, na estação seguinte, o espaço seria invadido por hordas de gente. Ligou o leitor de mp3 em forma alietória e foi trauteando as músicas baixinho, enquanto deixava que cheiros e sabores recentes tomassem conta de si. Aninhou-se no banco e fechou os olhos, embalada pela partida suave do comboio. No leitor de mp3, os Blink 182 começam a entoar "I Miss You".
Toca o telefone, sobressaltando-a como sempre.
_ "Oi", atende baixinho, com um sorriso nos lábios. Diz?
_ "Nada... É só para te dizer que gosto de ti..."
_" E eu de ti..."

E então, é como se o comboio parasse e a Cidade se fosse afastando de si, enquanto duas lágrimas lhe escorrem pelo rosto tapado pelos grandes óculos escuros. " Don´t waste your time on me, you're already the voice inside my head... I miss you, I miss you..."

agosto 24, 2005

Fénix


Renasce das cinzas e cresce de novo. Torna-te maior, melhor, diferente.
Deixa o fogo que te tranformou dar-te forças para que as fragilidades se soltem para sempre.
Volta a ser como eras, não deixes que o Mundo se vire contra ti, te culpabilize de pecados não cometidos, de falhas inexistentes, de vidas e dependências cobradas sem motivo.
E, um dia, vais olhar para o espelho e sorrir de novo.

agosto 23, 2005

Why me?

"E se tu deixasses, tomava conta de ti para sempre..."
Se, a muito boa gente, este tipo de coisa alimenta o ego, a mim incomoda-me.
Eu sei tomar conta de mim, não preciso que o façam.
Detesto gente com a mania das dependências. Quando se propõem a tomar conta de nós querem, de facto, que tomemos conta deles. E,mesmo sendo giros, os meus dois filhos são mais giros e só deles eu tomo conta.
Qual é a parte da palavra NÃO que os gajos não percebem, hã?

agosto 22, 2005



Consome-me por dentro um fogo imenso, que me deixa sem forças sequer para sentir o gelo dos teus dedos quando percorrem o meu corpo. O calor que de mim irradia destrói tudo por onde passo, deixando para trás apenas um rasto de memórias, também elas negras apenas com alguns laivos de azul. Derretes à minha frente, frágil, volátil, enquanto eu estendo as mãos numa vã tentativa para te salvar e me deixo envolver no meu próprio fogo, não restando mais que um simples monte de cinzas fumegantes que arrefecem lentamente.

Não te farei mais mal. Não me servirei da força do fogo para entrar em ti. Serei apenas uma neblina que te abraçará enquanto precisares, um degrau para que possas subir mais alto. E depois, lentamente, elevar-me-ei para te deixar seguir sozinho.

agosto 18, 2005

Mano a Mano IV

Vi-te, a semana passada.
Ia a caminho da praia e apareceste ao longe, à beira da estrada. Os mesmos calções,o mesmo pólo, os mesmos óculos escuros. O mesmo corpo. A mesma forma de pegar no cigarro.
Gelei, à medida que o carro se aproximava de ti; não me viste, estavas a conversar com alguém enquanto passavas os dedos pelo cabelo daquela forma que te era tão familiar. E, quando o carro passou, percebi que não eras tu...

Hoje levei-te flores. Foi a Mummy que pediu, está no Algarve com a tua mulher e os teus filhos. Achei-os bem, quando telefonaram de manhã. Sete meses depois, a vida começa a tomar contornos de normalidade em alguns momentos. Foi coincidência, ter tomado decisões tão importantes justamente no dia em que te visitei pela primeira vez. Sei que as compreenderias, mesmo tendo que magoar pessoas de quem ambos gostamos com elas. Mas é a minha forma de levar a Vida em frente. Já que tu não o pudeste fazer.

agosto 05, 2005

E finalmente...



Volto qualquer dia deste mês.
Beijos e abraços.


Isto é o que vi da varanda da cozinha há cinco minutos atrás. O ar está irrespirável com tanto fumo e 42ºC.
Estou de ar condicionado ligado e a fazer as malas para ir amanhã de férias.
E quem não tem essa possibilidade?

O país continua a arder de cada vez que a temperatura sobe mais um pouco e a humidade desce.
Falando no MSN com amigos do Porto, dizem-me que às 6 da tarde estão de luz acesa porque a escuridão é muita. Com fotografias a comprovar.
De Lisboa, ao telefone, dizem-me que às 11 da noite o cheiro a fumo se torna insuportável.
Por aqui, acabei de sair do cinema e o ambiente está sufocante, sente-se o fumo nos olhos, no nariz, na pele, apesar de não se ver.

Não será altura de deixar de brincar e estabelecer medidas concretas e válidas no combate aos fogos? O TGV e o novo aeroporto podem esperar um bocadinho, acho, e gastar o dinheiro em coisas mais urgentes. E haverá prioridade maior que esta?

agosto 04, 2005



Quando eu morrer, não me fechem com os braços cruzados no peito numa caixa de madeira com rendas e folhos, em traje de gala e sapatos de salto alto .
Não me deitem cal por cima, não me enterrem num solo cheio de vermes que me possam corroer as memórias que quero levar comigo. Não me deixem a apodrecer lentamente debaixo do chão, a desmembrar-me aos poucos até a terra me absorver por completo e passar a fazer parte do mundo dos Esquecidos.

Reduzam-me antes a cinzas e façam-me voar nas asas do vento, em partículas quase invisíveis que abracem intemporalmente aqueles que amo de forma a que percebam que os levo comigo para onde quer que vá. Deixem-me ser o Pó das emoções que ficaram por viver, de tudo o que não tive coragem de fazer, das palavras que não consegui proferir. Não perpetuem os erros de quem parte porque quer.

agosto 03, 2005



Era uma vez uma boneca de trapos que não sabia o que eram emoções e sentimentos. Sentada na sua cadeira, via as pessoas que a rodeavam a chorar, a rir, assustadas, felizes...
Perguntava-se então porque agiriam assim aqueles seres estranhos, sem perceber o que os levava ao turbilhão de emoções que visualizava diariamente.
Curiosa, achou que queria sentir um bocadinho e, quando percebeu que não conseguia, ficou triste. Só muito tempo depois percebeu que a tristeza também é uma forma de sentimento e, a partir desse momento, passou por todas as emoções.

Mas, à medida que ia sentindo,a boneca ia perdendo bocados de si, fragmentos de pano que se iam soltando do seu corpo sem dar por isso. Quando se apercebeu, já tarde demais, a boneca era apenas alguns farrapos soltos e gastos sob o peso do que sentia. Chorou então, com saudades do tempo em que estava inteira.
Mas a saudade também é um sentimento e a boneca esfumou-se no ar para sempre, deixando atrás de si um rasto de emoções indefinidas que tomam de assalto os mais incautos, fazendo com que, ainda hoje, percam algo.

Light darkness



A escuridão aumenta, mais e mais.
Afundo-me num mundo sem luz e fecho os olhos porque não quero ver o que me rodeia.
Ao longe, uma réstea de claridade, persistente, teima levar-me a um mundo de cores e sensações que recuso tapando o rosto com as mãos.
Chega!
Quero penetrar nesta escuridão que me envolve, sentir o frio tomar conta de mim, ficar sozinha, deixar que congele tudo o que vai cá dentro e não tem como se soltar. Assim não há mágoa, não há dor, não há vida.
But...who cares, anyway?

Isto não costuma dar três dias antes?

É normal sonhar que o Panteão Nacional explode à frente dos nossos olhos, abrindo uma cratera enorme e bloqueando ruas que supostamente existem a 150 km do sítio onde ele está, enquanto calmamente tentamos enfiar uma mota ( que não temos) dentro do nosso local de trabalho para ficar à sombra?

agosto 02, 2005

Pronto, eu admito...

Um homem em casa faz muita falta!
Está uma gaja ali durante cinco minutos a tentar abrir um frasco de pickles (para fazer uma torta de bacalhau para o jantar), dá-lhe as pancadinhas do costume, tenta tirar o vácuo com a ponta de uma faca e, de repente, o frasco abre-se e ficamos cheias de pickles e vinagre até aos pés...

No escurinho do cinema

As luzes apagam-se no momento em que nos sentamos e a escuridão invade a sala. Encosto-me deforma a que a minha cabeça fique pousada no teu ombro e, instintivamente, damos as mãos, que permanecem unidas durante todo o filme.
Fecho os olhos por alguns segundos e apenas sinto o teu cheiro, ali ao meu lado, enquanto devagar me acaricias a mão.
Olhamo-nos nos olhos e, com um sorriso de cumplicidade, trocamos um beijo suave em que apenas os nossos lábios se tocam.
Volto a poisar a cabeça no teu ombro enquanto estreitas a distância dos nossos corpos e, juntos, mergulhamos num filme a dois.