novembro 10, 2004

Maria

Maria nasceu por acaso.
Aliás, nem era para ter nascido, não fora a mãe ter dado conta da gravidez tarde demais para a deitar pia abaixo.
Passou fome. Passou frio. Passou medo.
E aprendeu a guardar nos sonhos uma vida paralela. Na enxerga suja em que dormia todos os dias, sonhava não com coisas materiais que não conhecia, mas sim com sorrisos e afectos.

Maria cresceu entre trabalhos forçados e sovas regulares, na ignorância das letras e do corpo. Fez-se Mulher achando que aquele sangue era o resultado de uma sova paternal mais violenta; o corpo, aos poucos, foi ganhando formas e, estranhamente, as marcas da vida não ficaram nele.

Maria foi-se apercebendo que era objecto do desejo dos homens e da inveja das mulheres quando passava nas ruas .Achou que a sorte ia mudar, que ia ser acarinhada, mimada, senhora de atenções. Deu o corpo ao padeiro do bairro,aos catorze anos, porque ele lhe disse que tinha uns olhos lindos enquanto lhe amassava o peito como se amassa o pão do dia. Os restos do pão que ele lhe dava, às vezes.

E Maria foi-se dando pela vida fora,achando que algum daqueles que a possuíam um dia a ohariam com olhos de ver. Vendeu-se pelos sonhos que tinha.

Tonta que és, Maria, que abres as pernas à espera de seres feliz!
Maria, mulher desonrada, puta de esquina, objecto de prazer de quem não sabe que és gente. E que um dia sonhaste.

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