janeiro 31, 2005

Transparências

É um arrumador de carros em Lisboa, como tantos outros. Toxicómano, como a maioria. Os olhos dele não mentem. Está sempre high.
Tenho parado, por motivos que não vêm ao caso, com alguma frequência na zona que ele "domina" apesar de não ser, nem de perto nem de longe, cliente habitual. Mas, não sei bem porquê, o homem começou a reconhecer-me após o segundo ou terceiro estacionamento.
A primeira vez, brindou-me com um " Olá, por aqui hoje?", ao que respondi com um aceno tímido e um sorriso.
Mas um sábado destes disse-me, quando lhe dei a habitual moeda: "Boa tarde... Ena, hoje vai gira!!"
Eu, cheia de pressa, já atrasada e em passo de corrida, ainda me virei para trás e , depois de uma gargalhada, respondi: Obrigada, até logo!
Quando voltei, horas e acontecimentos depois, passei por ele em silêncio e sorri. Ele olhou-me e disse-me: " Vai triste? Não esteja triste. É fim de semana, sábado e você ainda vai namorar hoje..."
_ Quem lhe disse que eu estou triste?, perguntei, sempre a andar.
_"Os seus olhos", respondeu.
Tornei a passar lá, este sábado. A pé, que o carro tinha ficado noutro local perto. Lá estava ele.
_"Então, o carro? Já me trocou por outro?, perguntou a rir.
Ri-me também e menti: _ Não, hoje vim de metro.
_Ah, 'tá bem. Olhe... sabe? A tristeza já mal se nota... Continue assim.



Raio do homem.... ou raio de mim, que não me sabia tão transparente.



janeiro 26, 2005

_Tia, sabes o que quero ser quando for grande?"
_
Não, querido, diz lá...
_Quero ser aviador.
_
Aviador? Porquê?
_Porque assim posso voar muito alto, lá para cima das nuvens e levar a minha mãe a ver o meu pai.

janeiro 25, 2005

Amor

Cala-te, a luz arde entre os lábios,
e o amor não contempla, sempre
o amor procura, tacteia no escuro,
essa perna é tua?, esse braço?,
subo por ti de ramo em ramo,
respiro rente à tua boca,
abre-se a alma à língua, morreria
agora se mo pedisses, dorme,
nunca o amor foi fácil, nunca,
também a terra morre.

Eugénio de Andrade

janeiro 24, 2005

Abraço


A campaínha tocou , assustando-a e tirando-a da letargia em que se encontrava. Arrastou-se para a porta e, sem ver quem era, abriu-a de par em par.
Olhou-o nos olhos, em busca do consolo desejado.
Ele abriu os braços, envolvendo-a num abraço apertado, enquanto lhe beijava os cabelos e lhe fazia festas no rosto.
_"Estou aqui...",dizia-lhe baixinho ao ouvido, enquanto a levava para dentro de casa. "Pronto, eu estou aqui..."
Ela deixou cair todas as barreiras, todas as defesas que tinha erguido ao longo dos últimos dias. Porque tinha que ser forte. Mas, com ele, não precisava de mostrar força. E expôs-se como ainda não o tinha feito. Não chorou, porque não tinha mais lágrimas para chorar. Enroscou-se no colo dele e deixou-se ficar de olhos fechados com a certeza de que, com ele ali, nada mais de mal lhe iria acontecer. Sentiu-se protegida e segura e, finalmente, adormeceu naquele abraço.

Quando acordou, estava sozinha novamente. A lareira, entretanto apagada, tinha deixado entrar o frio gélido da noite que entretanto tinha chegado. Sentiu um arrepio que lhe atravessou o corpo e sentiu-se atordoada, perdida no tempo. Achou que tudo não tinha passado de um sonho, que tinha estado sempre sozinha. Tapou-se ainda mais com a manta que tinha sobre si. Manta? Mas ela não se tinha tapado, tinha a certeza! Bem desperta, agora, lembrou-se que nem a lareira tinha acendido; mas as brasas brasas ainda quentes estavam lá, prova de que alguém lhe tinha mexido.

Sentou-se, confusa e viu um bilhete ao lado da almofada,a dois palmos da sua cara.
" Fui comprar comida para jantarmos. Levo as tuas chaves, para o caso de estares ainda a dormir quando chegar. Amo-te..."

O barulho familiar das chaves a rodar na fechadura trouxeram-lhe a realidade de volta. Porque a vida real também tem coisas boas.

janeiro 22, 2005

Gostei tanto desta música que ouvi no Incomensurável , que resolvi roubá-la.

janeiro 21, 2005

A dor

A dor aumenta e diminui, de forma cíclica. De manhã, não sei porquê, é muito maior. Aperta o coração e quase deixamos de respirar. Trememos por dentro como se um terramoto nos sacudisse mas, ao vermos a nossa imagem no espelho, estamos imóveis. Estáticos. Parados. Mas não mortos. Depois lentamente o mundo começa a mexer à nossa volta e percebemos que temos que continuar, mesmo que doa.
E seguimos as nossas rotinas do " antes" como se nada se tivesse passado, a não ser o nosso olhar que mudou. A forma como vemos os outros é diferente, "depois". E através dessas rotinas há momentos em que quase esquecemos. E, de repente um som, uma palavra, uma imagem, um cheiro, trazem de novo tudo. Brutalmente. Mas respiramos fundo, ganhamos coragem e começamos tudo de novo, uma hora de cada vez, um dia atrás do outro. E cada um custa mais que o outro.
Por enquanto, até o riso dos pequenitos dói. É injusto darmos tanto de nós durante anos àqueles que geramos e as memórias deles serem tão curtas. Qual será o cantinho onde eles "o" vão guardar? Mas, simultaneamente, é essa alegria que nos vai mantendo alertas para que"ele" continua vivo, perpetuado neles.
Eu sei que vai haver um dia em que a dor ameniza e dá lugar à saudade.
E aí poderei pensar "nele" com um sorriso nos lábios e desfrutar de todas as recordações sem que se me rasgue a alma.

janeiro 19, 2005

A ordem natural das coisas

Há certas coisas que deveriam ser, por leis da natureza, imutáveis.
O Inverno deveria ser sempre frio e chuvoso e o Verão quente, por exemplo. Assim saberíamos com o que contar.
Um pai também não deveria ter que passar pela provação de ver morrer um filho; ou uma mãe , no dia em que faz anos, ter de enterrar alguém que fez nascer; ou ainda uma mulher grávida sentir o seu filho mexer dentro do ventre enquanto quem o gerou se apaga para sempre e depois ter que explicar, a duas criaças de oito e cinco anos, porque é que nunca mais vão poder ver o pai.
Não é esta a ordem natural das coisas. Mas a Vida, às vezes, prega-nos partidas destas.

E há que aprender a seguir em frente e ajudar a fechar as feridas de quem sofre mais do que nós, por muito grande que seja a nossa dor. Porque com essa, nós sabemos lidar. Com as recordações, os sorrisos, as brigas, as esperanças, as alegrias.

Que a ansiedade da doença, o pulo de coração de cada vez que o telefone tocava, o ver de dia para dia o sofrimento aumentar, esses acabaram. Pelo menos, em relação a ele.

Adeus, meu querido. Gosto muito de ti. Sempre gostarei.


janeiro 16, 2005

Porque ajudar, às vezes, não custa nada

Apelo à Humanidade

"Tivemos a tristeza de ver recentemente o tsunami, causando uma grande destruição e vitimando um número inconcebível de pessoas em sete países da Ásia. Sabemos que esse tipo de facto é um acontecimento natural, porém havemos de analisar e acrescentar que a intensidade desse tsunami mostra-nos claramente que o desequilíbrio ambiental é, incontestavelmente, potencializador de forças naturais deste porte. Cabe a nós, definitivamente, uma reflexão séria sobre o assunto e buscarmos maneiras mais correctas de lidarmos com o espaço em que vivemos para que não sejamos os responsáveis por catástrofes desta natureza."

Para continuar a ler o texto, vá ao Fraternidade

janeiro 14, 2005

Vou de fim de semana.
Sair de todo este sufoco que tem sido a minha vida ultimamente e tentar rir com pessoas de quem gosto e que sei que gostam de mim. Namorar. Receber e dar mimo, muito mimo.
Espero não ter que voltar apressadamente.
Até Domingo.

janeiro 12, 2005

Mas que é lá isto?

Se descubro quem foi o engraçadinho que deu o meu mail para a mailing list da CDUViseu, vamos ter gaitas abaixo!

Ai vamos, vamos!!

E o prémio " O Birras do Ano" vai para...


janeiro 11, 2005

Volta Seinfeld, estás perdoado!!

O doutor Sócrates disse ontem que vai recuperar os 150 mil empregos perdidos no último mandato da coligação PSD/PP.

Ó doutor: considerando que , em números redondos, já havia cerca de 500 mil desempregados, isto dá um total de 650 mil, certo? Mais coisa , menos coisa. Considerando ainda que , desse total, uns 50 mil querem de facto trabalhar em vez de viverem à custa do subsídio de desemprego:

Não acha que está a deitar à rua uns 600 mil votos quando diz essas coisas?
Eu acho isto muito estranho:
Vai para três dias que não recebo nenhum mail a dizer " Enlarge your pennis".
Tá mal.Já nem o junk mail é como era antigamente!
Eu divertia-me à brava a ler aquilo e agora népias . Bolas!

janeiro 10, 2005

Riachos



Parou o carro, completamente perdida. Tinha andado horas, dias a fio, tinha perdido a noção do espaço e do tempo. Não parou para perguntar o caminho correcto, porque este não existia. Ou porque nenhum caminho lhe parecia correcto. O dia amanhecia, num daqueles momentos exactos em que não é ainda de dia mas também já não é de noite. Desligou o leitor de cd's e deixou-se envolver pelo silêncio, reconfortante para quem tem os pensamentos a girar a mil à hora dentro de si.
Fechou os olhos por breves momentos e pareceu-lhe ouvir o barulho de água a correr. Abriu os olhos. Não era imaginação sua, havia algures ali perto um curso de água.
Saiu do carro e caminhou por entre os arbustos densos, escuros ainda àquela hora matinal. E viu-o: um pequeno riacho corria por entre pedras e ramos, num gorgolejar reconfortante.
Tirou as botas e as meias, arregaçou as calças e sentou-se numa pedra lisa, ali na margem. Mergulhou os pés na água gelada e um súbito arrepio de frio atravessou-a. Mas deixou-se estar, com o sol que entretanto tinha nascido a brincar com os seus dedos no meio da água transparente. A corrente era fraca, mas suficiente para embater nos tornozelos e deixá-la salpicada.
No bolso das calças, o telemóvel começou a tocar... estranhamente, o toque tinha mudado e estava transformado num chilrear agradável, que em nada perturbava aquele momento.

Atendeu, olhando ainda o jogo de sedução que a água fazia com os seus dedos dos pés.
"Olá, bom dia. Estás boa? Passei a noite a sonhar contigo..."

Sorriu e mergulhou.

janeiro 09, 2005

Filosofias

"Nunca se mergulha duas vezes no mesmo rio," disse Heráclito.

Sinto esta verdade como se fosse minha.
Pode ser o mesmo rio, mas nunca serão as mesmas águas.
É deste dinamismo que necessita o rio.
Que para existir precisa de águas frias,
de confluências,
de turbulências,
de chapinhanços,
de sol que o aqueça,
de chuva que o faça crescer,
de margens que o segurem e o encaminhem para o seu destino.
Que nem ele próprio sabe qual vai ser.
Com azar, seca antes de lá chegar até se tornar chuva e se juntar a outro rio.
Com sorte, espraia-se num oceano azul, funde-se nas suas águas salgadas e torna-se parte integrante dele.
Os rios são como as relações pessoais, ao fim e ao cabo.

janeiro 08, 2005

Rapid Eyes Mouvement

Ontem fui ver o concerto dos R.E.M. ao Pavilhão Atlântico.
Espectáculo simpático, sem grande história. O som deixou muito a desejar , assim como a sintonia de algumas imagens com a letra das músicas. Erros de segundos que se pagam caro, porque toda a gente repara. Ou reparei eu, porque a disposição para ali estar não seria das melhores.
Mas é sempre bom ouvir um coro de milhares de pessoas a cantar "Loosing my Religion" ou "Man on the Moon", bem como ouvir ao vivo algumas músicas deste último álbum.

Mas este post não era bem para falar dos R.E.M., mas sim de um fenómono que vi pela primeira vez neste concerto: já assisti a mais de uma dezena de espectáculos do género, mas, com a chegada das novas tecnologias, foi a primeira vez que vi durante as músicas mais calmas, a substituição dos tradicionais isqueiros pelas luzes dos ecrans dos telemóveis. Espectáculo surpreendente, bonito, mas sem a mística das milhares de luzinhas frágeis e bruxuleantes abanadas ao ritmo da música.

Enfim, sinais dos tempos.

janeiro 07, 2005

Confusões

Momentos bons e momentos maus, nostalgias e alegrias.

Posts sem conteúdo apenas pelo prazer de calcorrear o teclado com os dedos e ver as palavras aparecerem assim, desordenadas como pensamentos soltos , subjectividades que se soltam sem darmos conta.

Estado de confusão mental permanente ou apenas desencontros inseguros de formas de estar na vida diferentes?

Mágoas e desejos.
Prazeres adiados. Não desejados? Cansados?

Incertezas, dúvidas, choros....
Meros consolos?



Não perceberam nada, não é? Azarico.

janeiro 05, 2005

Blue toughts ou um poste lamechas e estupidamente romântico

Porque descanso quando entro no azul dos teus olhos?
Quando me abraças com força e me proteges de tudo, sou menina-mulher. E sei que nada de mau me pode acontecer; porque tu não deixas.
As tuas mãos quentes nas minhas, estranhamente geladas; aqueces-me as dúvidas, as inseguranças.
Adoro-te.


Yes, I'm in love, so what?

janeiro 04, 2005

Intimidades

A capacidade de adaptação do ser humano às situações difíceis é admirável.Quatro quilos a menos e muito stress depois, atirei tudo para trás das costas e fui ao cinema. E dei comigo a rir com as maluqueiras da Bridget Jones, a descarregar através do riso tudo o que tenho acumulado cá dentro. Rir é bom, definitivamente. Faz bem ao íntimo.À alma, o que quer que isso seja. A vida segue em frente e é necessário fazer pausas interiores nas tragédias pessoais. A bem da própria sanidade.

ps: É um post pessoal, ah pois é.

ps1: As historietas do costume seguem dentro de dias, mais ou menos sofridas, mais ou menos sentidas.

ps2: As benzodiazepinas também são uma grande ajuda. LOL

janeiro 01, 2005

Informação Inútil

É só para dizer que tive que tirar dali aquele mapa/contador todo catita da Geoloc porque o Firefox encheu-se de ciúmes, chamou o Flash ( não o Gordon,o outro), e resolveram brigar com o pobrezinho.
Logo agora que isto estava tão jeitozinho...
Um bom 2005 a todos.



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