outubro 30, 2006

Deserto

Os pés tocam a areia escaldante. O sol, tórrido, não deixa respirar e o peito sufoca com o calor que o ar, seco, transmite. Avança hesitante; sabe que a caminhada é longa e desgastante.
Não se vê vivalma. São muitos os quilómetros que sabe tem que percorrer .
Arrasta-se sem rumo na procura de um oásis. Em vão
Areia e areia,quilómetros de nada sucedem-se sem um fim previsto.




Enfim, o costume.

outubro 29, 2006


Percorro ruelas semi destruidas, escuras. A alma desfeita à procura de luz. Os passos ecoam nas pedras geladas e húmidas, onde o sol não penetra há muito, muito tempo.
Não há ninguém nessas ruas.
Nunca há ninguém...
São apenas labirintos de solidão que se entrecruzam para me confundir.
Páro.
O silêncio é total.
Deixo que o frio me invada e, aos poucos, transformo-me numa daquelas pedras que há pouco pisei.
Integro agora uma cadeia morta de rochas .
Companheiras.

outubro 24, 2006

Pequenos prazeres (2)


Saí do comboio e nuvens carregadas prenunciavam a chuvada que se avizinhava.
Desci as escadas da gare do Oriente e o cheio inconfundível de castanhas assadas invadiu-me as narinas. Segui-o, quase de olhos fechados, até ao vendedor.
As castanhas agora vêm dentro de folhas brancas, já não deve haver jornais velhos nem páginas amarelas. É pena. E custam 2 euros. Dois euros por dozes castanhas.
Mas a gula foi mais forte e, já na posse do ( ainda) tradicional cartucho, percorri as centenas de metros que me separavam do meu destino com as mãos sujas, a boca cheia de castanhas e um sorriso nos lábios.
Your EQ is 160

50 or less: Thanks for answering honestly. Now get yourself a shrink, quick!
51-70: When it comes to understanding human emotions, you'd have better luck understanding Chinese.
71-90: You've got more emotional intelligence than the average frat boy. Barely.
91-110: You're average. It's easy to predict how you'll react to things. But anyone could have guessed that.
111-130: You usually have it going on emotionally, but roadblocks tend to land you on your butt.
131-150: You are remarkable when it comes to relating with others. Only the biggest losers get under your skin.
150+: Two possibilities - you've either out "Dr. Phil-ed" Dr. Phil... or you're a dirty liar.

outubro 22, 2006

Pequenos prazeres (1)

Acordar de manhã com a chuva a bater nas vidraças, olhar para o relógio e pensar que são horas de levantar , perceber que é domingo e enroscar de novo.

outubro 17, 2006






Despojo-me de roupas supérfluas e mostro-me a ti, inteira.
Despida de preconceitos, juízos de valor ou sequer expectativas, entrego-me.
Deixo que me percorras a alma, me devasses por dentro.
Confio.
Nos teus braços sou Menina no riso, Mulher no sexo.
E, quando nos tornamos um só, quando a tua carne entra em mim, deixamos tudo o que nos separa fora de nós e rasgamo-nos como se fosse a última vez.

outubro 15, 2006

And I'd give up forever to touch you
'Cause I know that you feel me somehow
You are the closest to heaven that I'll ever be
And I don't want to go home right now

And all I can taste is this moment
And all I can breathe is your life
'Cause sooner or later it's over
I just don't want to miss you tonight

Iris, Goo Goo Dolls
Coloca a mão na maçaneta e abre a porta para sair.
Tenta não olhar para trás, mas não consegue.
Pára.
Percorre com o olhar as paredes e os móveis, demora o olhar em cada objecto.
Relembra os sonhos e as expectativas de quando, pela primeira vez, entreabriu aquela porta.
Um sorriso amargurado nasce-lhe nos lábios, como um esgar de dor.
Deveria ter percebido há muito que há locais que nunca serão nossos, sonhos que não temos o direito de sonhar. Por muito que se lute e reme contra a maré, a ordem natural das coisas é sempre mais forte.
Toca levemente as paredes num gesto de despedida.
Depois suapira e fecha a porta. Para sempre.
Consigo, leva apenas as memórias. Essas, ninguém lhas consegue tirar.

outubro 13, 2006


Fica a vê-lo partir por entre a porta entreaberta ( ou será entrefechada?), dirige-lhe um último olhar, retribuído mesmo no fim das escadas e selado com um beijo à distância.
Fecha a porta e olha para o quarto, a cama revolta que ainda cheira à entrega intensa vivida apenas minutos antes.
O silêncio é total.
Aos poucos, apanha as peças de roupa espanhadas pela casa que ele, ávido, lhe tirou assim que chegou. Sorri cansada, dorida da paixão vivenciada e deita-se naqueles lençóis ainda quentes.
A cama parece-lhe grande, agora que está vazia.
Aninha-se no cheiro e nas recordações e adormece entre um sorriso e uma lágrima.

outubro 12, 2006


Deixo que os dedos percorram as teclas ao acaso sem emendar sequer os erros que surgem.
Ganham vida as teclas, autónomas, os dedos não as tocam, já.
Continuam a escrever palavras , frases, textos inteiros que não reconheço como meus. Observo-lhes os movimentos e sorrio enquanto me afasto, deixando-as naquele ziguezague.
Espreito pelo canto do olho.
Apesar do movimento incessante, o texto está em branco.
Sorrio de novo.
Há pedaços de nós que não passam nunca para uma folha de papel.

outubro 06, 2006

Ausência

Quero dizer-te uma coisa simples: a tua
ausência dói. Refiro-me a essa dor que não
magoa, que se limita à alma; mas que não deixa,
por isso, de deixar alguns sinais - um peso
nos olhos, no lugar da tua imagem, e
um vazio nas mãos, como se as tuas mãos
lhe tivessem roubado o tacto. São estas as formas
do amor, podia dizer-te; e acrescentar que
as coisas simples também podem ser
complicadas, quando nos damos conta da
diferença entre o sonho e a realidade. Porém,
é o sonho que me traz a tua memória; e a
realidade aproxima-me de ti, agora que
os dias correm mais depressa, e as palavras
ficam presas numa refracção de instantes,
quando a tua voz me chama de dentro de
mim - e me faz responder-te uma coisa simples,
como dizer que a tua ausência me dói.

Nuno Júdice, in " Pedro, Lembrando Inês"

outubro 05, 2006


Abriu os olhos.
Estava num quarto que não era o seu, numa cama que não era a sua. Estranho, tinha-se deitado na noite anterior, como sempre, na cama que lhe albergava os sonhos há anos.
Pestanejou. A luz branca, demasiado clara, feria-lhe os olhos. Aos poucos, foi-se habituando à luminosidade e percebeu que não estava sozinha; rostos ansiosos, a adivinhar um sorriso, aproximavam-se de si.
Sentiu-se incomodada. Não conhecia nenhuma daquelas pessoas, apesar de alguns rostos lhe serem vagamente familiares.
Com lágrimas a bailarem nos olhos, um jovem olhou-a nos olhos e disse-lhe: Mãe?
Sentiu um choque!
Aos poucos, foi olhando de novo em redor. Reconheceu de imediato os filhos; mais velhos, já não eram os adolescentes a quem tinha dado um beijo de boa noite e aconchegado a roupa, no dia anterior. O indivíduo careca e com uma barriga incipiente era o marido, tal como ela o imaginava dali a uns ano. À si frente. Aos outros não reconheceu, percebeu serem pessoal hospitalar, Percebeu-o também quando viu a cama e o quarto com outros olhos.
Encheu-se de suores frios, não percebia o que se passava. A filha chorava copiosamente de mão dada com ela. Mãe, mãe...!
Explicaram-lhe que tinha entrado em coma há sete anos atrás, inexplicavelmente.
Assim como não tinham explicação para o facto de, agora, ter saído dele.
Teve uma sensação de desmaio, como se o cérebro não conseguise absorver a imensidade do que lhe diziam.
Sete anos!?
Tinha perdido tanta coisa, tudo...
Tentou sair da cama, levantar-se e, aos poucos, conseguiu.
Ao canto do quarto, um espelho colocado discretamente devolveu-lhe a imagem que procurava: a sua.
E percebeu que, mesmo que não se viva conscientemente, os anos deixam-nos, inexoravelmente, a sua marca.

outubro 01, 2006

Era uma vez um rapaz.
Sonhador, como todos e sozinho, como muitos.
Percorreu a vida passando-lhe ao lado e sentia-se triste sem saber porquê.
Um dia apareceu-lhe uma fada que lhe perguntou: queres ser feliz?
Ele respondeu que era feliz à sua maneira mas que sim, que queria ser mais feliz.
E o que precisas para ser mais feliz?_ perguntou a fada. Eu dou-te...
Ele pediu o costume, dinheiro e essas coisas todas.
A fada sorriu-lhe, um sorriso triste e murmurou: deixo-te com a tua felicidade.
Partiu como tinha vindo, desaparecendo no ar.
A vida do rapaz continuou e, um dia, tentou chamar a fada: tenho saudades tuas, volta...
Mas ela, lá do alto, não o ouviu... brincava com a lua e com as estrelas.